Empreendedorismo e as crises inesperadas

Há três anos, escrevi um texto onde explicava como ganhar dinheiro com o aluguel de imóveis, mesmo sem possuir um imóvel para alugar. Hoje, escrevo retomando aquele texto para explicar um erro primário que muitos que aplicaram aquela idéia cometeram, e hoje estão beirando a falência por conta deste erro.

É bom explicar que as pessoas que erraram brutalmente não seguiram minha idéia. Nem me conhecem. Apenas tiveram elas próprias essa idéia, mais ou menos na mesma época. E mais, não estamos falando de uma ou duas pessoas que tenham cometido esse erro, mas de gente suficiente para o assunto se tornar matéria no Wall Street Journal.

A idéia era simples: alugar um imóvel, colocando no contrato a possibilidade de sub-locação. Negociar um valor mais em conta por conta de um contrato de longo prazo. Decorar o imóvel de maneira a torná-lo aconchegante e completo para alugar por temporada, e listá-lo no AirBNB ou serviços semelhantes para lucrar com a diferença entre o valor do aluguel tradicional e o da locação por temporada.

Uma alternativa, para quem tivesse a possibilidade, seria adquirir os imóveis através de financiamento, e ir usando os lucros para pagar o saldo devedor, podendo ainda ir encadeando isso em novos imóveis a medida em que os aluguéis fossem aumentando a renda e com isso pudessem iniciar novos financiamentos.

Apesar de simples, muitas pessoas que montaram para si este tipo de negócio, algumas inclusive tendo feito isso com várias propriedades, cometeram um erro primário no mundo dos negócios.

Qual é o erro mais comum de se cometer no mundo dos negócios?

O erro mais comum nas pequenas empresas, para quem monta seu primeiro negócio, é misturar o fluxo financeiro dos negócios com suas finanças pessoais. Quanto mais a empresa fatura, mais a pessoa gasta em sua vida pessoal. Pessoa e empresa são uma coisa só. EUpresa, como costumo chamar.

Não há nada de errado em montar um negócio pessoal, uma empresa onde você seja o faz-tudo e todo dinheiro retorne para você próprio, mas as contas da pessoa física e da empresa precisam ser distintas. E os planos e previsões de um e outro também. Desta forma, as despesas da empresa devem ser bem avaliadas e contingências estimadas.

As pessoas que hoje estão pedindo falência por terem sua renda de locação por temporada indo a zero durante a crise do Corona Vírus, são justamente as que não fizeram, nos bons tempos em que o negócio estava faturando bem, uma reserva financeira suficiente para cobrir alguns meses em que eventualmente pudessem haver problemas. E problemas sempre acontecem, seja uma crise como a que estamos passando, seja algo mais simples, mas igualmente caro para se resolver, como um encanamento que precise ser trocado por conta de vazamento, ou até mesmo um incêndio, para os que nem seguro contra isso fazem.

É triste de ver esse tipo de coisa acontecer com empreendedores bem intencionados, principalmente por ser tão simples de evitar se tivessem pensado um pouco mais nos detalhes do negócio, em vez de simplesmente pensarem em quanto poderiam ganhar e, assim que o dinheiro começou a jorrar, passaram a pensar somente em todas as coisas nas quais poderiam gastar o dinheiro. Um planejamento mínimo e uma pequena reserva para garantir alguns poucos meses de pagamento dos aluguéis e condomínio caso ficassem sem entradas de dinheiro por um tempo já seria o suficiente para manter o negócio andando, ou ao menos dar tempo de tomarem alguma iniciativa para evitar a falência.

Então termino perguntando: se você tem uma pequena empresa, você estava preparado para conseguir contornar esta crise? Se não estava preparado, o que precisaria ter feito? Mesmo estando no meio do furacão, é bom pensar neste tipo de coisa agora, pois tudo que começa, um dia acaba, e da próxima vez, quem sabe, você estará melhor calçado para enfrentar os desafios.

Lembre-se sempre que o tombo é o melhor professor, mas temos que aprender a lição para não repetir. E melhor do que ter que aprender deste jeito, é fazer o exercício na cabeça antes de se jogar nos negócios. Pense sempre antes de começar: qual a pior coisa que poderia acontecer? Qual a situação em que eu teria que fechar meu negócio se acontecesse? Em que cenários eu teria um prejuízo enorme? Com as questões mapeadas, desenhe as possíveis saídas de cada crise que você antecipou. E lance seu navio ao mar. Saiba sempre onde você quer chegar, mas também em quais as saídas possíveis se o destino não puder ser alcançado.

Empreender é tudo de bom, faça com o cuidado que seu futuro merece.

PS: para os que perguntaram, desde que lancei a idéia no site, tive algumas pessoas me indagando sobre isso ao longo dos últimos três anos. Para todas, minha resposta sempre envolvia a pergunta de como manter o negócio se houvesse qualquer tipo de problema em manter o negócio funcionando. Minha preocupação não era com algo como o Corona Virus, não tinha como antecipar isso, mas sim com algo mais trivial como uma doença qualquer que inviabilizasse o trabalho necessário para manter o andamento do negócio. Sempre sugeri, por exemplo, a inclusão de alguma forma de saída do aluguel de longa duração, seja por meio de multa de alguns meses de pagamento extra para antecipar a entrega do imóvel, no caso da locação de longo prazo, seja via a entrega/venda do imóvel no caso de ter adquirido através de financiamento.

PS2: conheço muitas pessoas que fizeram o mesmo tipo de negócio com a locação de veículos para utilizar como Uber e não “gastar” seu próprio carro, ou ainda que compraram vários carros financiados e sublocavam elas próprias para pagar as prestações do mesmo. Vale o mesmo, qual sua estratégia de saída?

Autor: Fabricio S. Peruzzo

Papai investidor, marido, polímata, empreendedor, curioso. Tranquilidade financeira é qualidade de vida.

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